LXXIV - O sino trincado
É amargo e é doce, em noites hibernais,
Escutar junto ao fogo que palpita e fuma,
As lembranças distantes voltarem iguais,
Ao som dos carrilhões cantando em meio à bruma.
Bem ditoso é o sino de voz rigorosa
Que muito embora idosa, é alerta e violenta,
E lança fielmente a prece religiosa,
Como um velho soldado a velar sob a tenda!
Eu, minha alma é fiel, se em tristezas perdida
Quer de cantos povoar das noites o ar gelado,
Acontece que às vezes sua voz combalida
Parece o estertor de um ferido largado
Junto a um lago de sangue, num monte de mortos,
E que morre, parado, em imensos esforços.
BAUDELAIRE, Charles. Flores do Mal. Tradução de Mario Laranjeira. 2ª Reimpressão. Editora Martin Claret. São Paulo, 2014.
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