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domingo, 19 de fevereiro de 2017

Spleen e Ideal - Charles Baudelaire.

XXXVI - O balcão

Mãe de toda lembrança, amante das amantes,
Ó tu, o meu prazer! Tu, todo o meu dever!
Tu lembrarás, por certo, os afagos constantes,
A doçura do lar e o doce anoitecer,
Mãe de toda lembrança, amante das amantes!

As noites alumiadas no ardor do carvão,
E as noites no balcão, veladas de ondas róseas,
Quão suave era o teu seio! E bom o coração!
Dissemos vezes mil imorredouras coisas,
As noites alumiadas no ardor do carvão,

Que belos são os sóis nas noites aquecidas!
Como o espaço é profundo! e o coração potente!
Ao debruçar-me em ti, rainha das queridas,
Eu cria respirar esse teu sangue olente.
Que belos são os sóis nas noites aquecidas!

Ficava a noite espessa qual biombo então,
E os meus olhos, no escuro, os teus olhos achavam
E eu bebia teu sopro, ó doçura! ó poção!
Teus pés nas minhas mãos irmãs já dormitavam.
Ficava a noite espessa qual biombo então.

Sei a arte de evocar os minutos ditosos,
E revivo o passado ao teu joelho abraçado.
Pois que adianta buscar os teus dengos langorosos
Fora do corpo teu e coração amado?
Sei a arte de evocar os minutos ditosos!

Essas juras, perfumes, beijos infinitos,
Renascerão de abismo a nós interditados,
Como sobem ao céu os sóis já reunidos
Após serem nos mares profundos lavados?
- Ó juras! Ó perfumes! Beijos infinitos!


BAUDELAIRE, Charles. Flores do Mal. Tradução de Mario Laranjeira. 2ª Reimpressão. Editora Martin Claret. São Paulo, 2014.

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