VII - A musa doente
Ó minha pobre musa, esta manhã, que tens?
Teus olhos fundos têm tantas visões noturnas,
E vejo cada vez refletir-se em tua tez
A loucura e a repulsa, frias, taciturnas.
O súcubo verdoendo e o róseo diabrete
Deitaram-te esse medo e esse amor taciturno?
O mau sonho, com punho audaz e irreverente,
Afogou-te imergindo em estranho Minturno?¹
Quisera que exalado o odor da saúde
Teu seio ideias fortes guardasse amiúde
E o teu sangue cristão fluísse em vagas iguais,
Como os múltiplos sons das vozes ancestrais,
Em que alternam o pai das canções desde outrora,
Febo, e o grande Pã, o senhor da lavoura.
BAUDELAIRE, Charles. Flores do Mal. Tradução de Mario Laranjeira. 2ª Reimpressão. Editora Martin Claret. São Paulo, 2014.
¹ A cidade antiga de Minturno (Minturnae) surgiu na Via Ápia, perto do rio Garigliano. Passou a se chamar Traetto depois de ser destruída, entre 580 e 590, pelos lombardos, só retomando seu antigo nome em 1879. (N. do E.)
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